Infância em pausa: os impactos do uso excessivo das telas no desenvolvimento infantil

Brincar, explorar, imaginar — tudo isso tem sido substituído por horas diante das telas. Nem sempre percebemos, mas enquanto a tela brilha, a infância pausa. Este post é um chamado para enxergar o que está sendo deixado de lado — e por quê.

Por Vanessa Garcia

5/26/20254 min read

Infância em pausa: os impactos do uso excessivo das telas no desenvolvimento infantil

A cena já se tornou comum — e desconcertante. Crianças pequenas, com os olhos vidrados em telas, mergulhadas em vídeos sem fim, deslizando o dedo com a familiaridade de quem nasceu nesse mundo digital. Parece inofensivo. Mas a frequência e intensidade desse comportamento merecem uma pausa.

Mais do que um costume moderno, o uso excessivo de telas por crianças e adolescentes está moldando, a forma como eles sentem, se relacionam e se desenvolvem. E por trás de cada clique, pode haver uma lacuna não percebida: a do desenvolvimento emocional e social saudável.

A infância não é digital — é relacional

O cérebro humano é moldado pelas experiências, principalmente nos primeiros anos de vida.
A conexão olho no olho, a resposta a uma emoção, o toque, a frustração, a espera — são esses microeventos do cotidiano que ensinam uma criança a lidar com suas emoções, desenvolver empatia, autorregulação, linguagem afetiva e compreensão social.

Mas quando boa parte do tempo livre é ocupado por dispositivos, essas experiências fundamentais são substituídas por estímulos rápidos, superficiais e solitários. O aprendizado emocional deixa de ser vivido.

Socialmente conectados. Profundamente sozinhos.

Vivemos a contradição da era digital: nunca estivemos tão conectados — e tão afastados uns dos outros.
As crianças crescem em ambientes onde a troca de olhares é constantemente interrompida por notificações.
Onde o afeto é mediado por telas e o “momento em família” é compartilhado no feed, não vivido na sua integralidade.

A socialização exige treino: saber esperar, cooperar, interpretar sinais não verbais, pedir desculpas, dividir, perder.
Mas se o tempo que deveria ser usado para brincar, explorar e conviver é ocupado por dispositivos, esse treino não acontece.

E sem treino, o músculo da empatia enfraquece.

Como o uso excessivo afeta o emocional da criança?

  • Regulação emocional prejudicada: ao evitar tédio, tristeza ou frustração com distrações digitais, a criança não aprende a nomear e tem dificuldade de atravessar emoções difíceis.

  • Baixa tolerância à espera: conteúdos rápidos e recompensas imediatas treinam o cérebro a não suportar pausas,podendo afetar inclusive o desempenho escolar.

  • Autovalorização distorcida: likes, seguidores e comparações criam uma falsa régua de valor pessoal — perigosa e instável.

  • Empatia enfraquecida: menos contato humano significa menos leitura de expressões, tom de voz e contexto emocional — essenciais para o convívio social.

  • Isolamento camuflado: mesmo cercada de estímulos, a criança pode estar se sentindo só — e os pais podem não perceber.

Efeitos colaterais sociais: do playground à sala de aula

Quando uma criança acostumada ao mundo digital encontra o mundo real, nem sempre ela está preparada.
Brincadeiras exigem negociação. Amizades exigem espera. Conflitos exigem escuta. Tudo o que as telas não ensinam — mas que a vida exige.

É na convivência diária, nas frustrações e pequenas conquistas, que se formam as habilidades sociais mais preciosas: cooperação, escuta ativa, empatia, resiliência e autocontrole.

Crianças que não desenvolvem essas competências podem ter dificuldades na escola, no grupo de amigos e até dentro de casa, nos pequenos rituais familiares.

O papel dos pais

A boa (ou má?!) notícia é que os adultos ainda são — e sempre serão — o principal modelo.
O papel dos adultos é mais importante do que qualquer aplicativo.
Pais atentos, presentes e coerentes ajudam a criar uma relação mais saudável com as telas e, sobretudo, com as emoções.

Algumas atitudes práticas:

  • Estabeleça limites claros e negociados para o uso de dispositivos.

  • Priorize momentos sem telas em família, como refeições ou passeios.

  • Dê espaço ao tédio: é dele que nasce a criatividade e a reflexão.

  • Escute seu filho com presença.

  • Ajude-o a nomear emoções, ao invés de distraí-lo toda vez que algo o incomoda.

  • Seja o exemplo: como você lida com seu próprio celular em casa?

Mais do que limitar o uso de telas, é hora de ampliar os espaços de conexão humana

O debate sobre tecnologia não pode se resumir a “pode ou não pode”.

A infância pede contato, risadas e abraços sinceros.
Adolescentes precisam de escuta, confiança, autonomia com limites e espaços para errar e recomeçar.
E todos — inclusive os adultos — precisam de pausas para sentir.

Reduzir o uso excessivo de telas não é sobre controle. É sobre reconectar a infância ao que ela tem de mais essencial: vínculos e vivências.

Com carinho,
Vanessa Garcia.
@institutoparental
contato@nessagarcia.com
www.nessagarcia.com

Sobre a autora:

Vanessa Garcia é Educadora Parental | Advogada | Pós-graduada em Educação Parental e Inteligência Emocional | Pós-graduada em Psicologia Jurídica.
Nascida e criada no Rio de Janeiro, Brasil, atualmente vive em Montreal, Canadá, com seu marido e filha.
Apaixonada pela subjetividade e complexidade do ser humano, pelo universo da maternidade e pelas histórias únicas que cada família traz, Vanessa dedica sua carreira a ajudar pais e mães a transformarem suas relações com amor e respeito.